Thursday, May 28, 2009
COMBOIO
Acabo de estar em Famalicão com a Cláudia. A Claudinha tenta perceber-me e percebe-me. Se não der para mais nada, dá para andar de mão dada ou de mão dádá. A gaja do lado dormita e mostra o rego das mamas. O revisor controla. Qualquer dia algum controleiro confisca os meus escritos. Ou alguma dama ofendida mete-me em Tribunal. O poeta infame passeia-se de mão dada com a Claudinha em Famalicão. As gajas boas entram na Trofa. O fim de semana está a acabar. O revisor percorre o comboio a controlar. Simpatizo mais com os revisores da CP do que com os "picas" do metro. Há outra postura. O mormon lê a Bíblia. Eu acabei a "Odisseia". Estou tão próximo dos outros passageiros que eles podem ler o que estou a escrever. Mal sabem que escrevo sobre eles. O mormon pousa a Bíblia. Outras agarram-se ás revistas. O que vale é que a gaja do lado está a dormir. Ñão deixava de ter piada uma discussão acerca do escritor que escreve. Uma revolta no comboio contra o escritor que escreve sobre as incidências de uma viagem de comboio Famalicão-Porto. Que querem? Dá-me para escrever. Não nasci assim mas tornei-me assim. Longe vão os tempos do Colégio da Trofa e dos liceus Sá de Miranda e Alberto Sampaio de Braga. No ano do Alberto Sampaio, 12º, comecei a ter com mais gente as conversas que só tinha com os meus melhores amigos do liceu: o Jorge e o Rui. Já falava então, sei lá, de coisas poéticas e filosóficas. Teria uma conversa interessante para as meninas. Comecei a pôr em causa o maniqueísmo do Rambo e de outras coisas. Comecei a ler livros. Depois, no 1º ano da Faculdade de Economia já lia muito. Enfim, o homem vai-se construindo. Era eu, então, um jovem promissor. Mas já lá estava a coisa do Morrison, a semente. Comecei a escrever algumas coisas de jeito. A querer mostrá-las. O que é feito desse rapaz? Do rapaz em quem os pais depositavam esperanças? Revoltou-se contra o número, revoltou-se contra a norma, revoltou-se. E nunca mais voltou a ser o mesmo.
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