Tuesday, July 29, 2008

MAIO DE 68 E OS SITUACIONISTAS


“A arte está morta, não consuma seu cadáver”.

“Mude a vida transforme seu mode d’emploi”

A Internacional situacionista foi criada em julho de 1957, em Cosio d’Arroscia, na Itália a partir da fusão de 3 grupos: a Internacional Letrista, o Movimento Internacional por uma Bauhaus Imagista e a Associação Psigeográfica de Londres. Ela teve em seus 12 anos de existência 70 membros de 16 diferentes nacionalidades. Mas devido às constantes exclusões (45 dos 70 foram excluídos e 19 desligaram-se) a I.S. poucas vezes teve mais de 10 integrantes simultâneos. Quando questionados sobre quantos eram, os situacionistas davam a seguinte e divertida resposta: “somos um pouco mais que o núcleo inicial de guerrilha em Sierra Maestra, mas com menos armas. Um pouco menos que os delegados que estiveram em Londres em 1864 para fundar a Associação Internacional dos Trabalhadores, mas com um programa mais coerente. Tão firmes como os gregos da Termópilas, mas com um porvir mais belo”.

A primeira fase da I. S. que vai até o início dos anos 60, ainda está muito marcada pela importância que davam aos temas arte e cultura. O grupo se apresenta como uma “frente revolucionária na cultura”. Para os situacionistas a arte sempre foi a mais alta forma do trabalho criador. E foi na crítica a arte contemporânea que o movimento inicialmente construiu sua crítica a sociedade espetáculo.

Recusavam uma arte fechada apenas nos seus propósitos estilísticos e formais. Queriam uma arte de ambiência, uma arte que negasse o sentido da própria arte, que afirmasse aos homens as impossibilidades contemplativas, uma arte como criação permanente e permanentemente reconstruível. Tinham um ponto de vista dialético da arte, assumindo a tarefa de “superar” a arte, ao abolir a noção de arte como uma atividade especializada e separada e transformando-a naquilo que seria parte da construção da vida cotidiana.

Do ponto de vista situacionista, a arte ou é revolucionária ou não é nada. A superação da arte só viria pela transformação ininterrupta do meio urbano. O que demandava fazer do urbanismo e da arquitetura as ferramentas da revolução do cotidiano. Segundo o programa Situacionista a imaginação deveria tomar de assalto o vazio existencial da cidade, subvertendo um cotidiano cego pelo hábito, restituindo significando aos espaços, despertando um passado mítico.

No período de 1960-61 acontece um grande expurgo dos “artistas” da I.S. que marca a passagem da “fase artística” para a “fase política”. À medida que o grupo se aprofunda em seu projeto de se tornar político, cada vez mais tomam destaque as questões objetivamente políticas, a organização de conselhos operários, a avaliação da nova fase do capitalismo… Os insultos aos surrealistas vão diminuindo, e cresce o número de insultos contra stalinistas, leninistas e intelectuais em geral. Freqüentemente aparentam parodiar os Trotskistas com suas exclusões, rachas, remissões à revolução permanente, hábito de batizar de “congressos internacionais” conversas de bar de 5 ou 6 pessoas.

O Trabalho teórico á que se dedicam Debord e Vaneigem (os dois principais teóricos situacionistas) depois de 1962 faz com que a I.S. se torne levemente discreta no período, o que é apenas um intervalo preparatório para uma nova fase da guerra que eles vêem à frente. A construção de textos com a atenção minuciosa daqueles que fazem bombas, desembocou nos principais livros do grupo, “A sociedade do espetáculo” de Guy Debord e a “Arte de viver para as novas gerações” de Raul Vaneigem, lançados quase simultaneamente no final de 1967.

Em 1966, os situacionistas usam todos os fundos do escritório da UNEF de Strausbourg para a publicação de um caderno intitulado: Sobre a miséria do meio estudantil. Esse texto foi reproduzido em praticamente todas as universidades. Em Nanterre, os estudantes usam o texto para começar sua própria revolta. Um desses estudantes, Daniel Cohn Bendit depois se lembraria: “o texto funcionou como uma espécie de detonador, nós fizemos tudo o que pudemos para distribuí-lo”.

EM 1968 aconteceu aquilo que muitos consideram a grande “obra de arte” situacionista, as revoltas francesas, que marcam o início do fim da I.S. efetivado através de um decreto de autodissolução em 1972. Talvez os mais importantes textos situacionistas sejam aqueles que apareceram nos muros de Paris de 68 como “Não trabalhe jamais”.

Teorias
“A mercadoria nós a queimaremos”.

“Abaixo a sociedade de consumo”.

Foram os situacionistas, e centralmente Guy Debord, que numa mescla de marxismo, anarquismo e surrealismo fizeram a crítica mais certeira à sociedade “espetacular mercantil” onde tudo se associa à mercadoria e essa se dá como espetáculo. Toda a vida é envolta por uma imensa acumulação de espetáculos.

A sociedade do espetáculo é o mundo das pseudo-necessidades, do consumo, o mundo em que o viver tornou-se uma representação caricata espetacular dos bens de consumo, “o mundo em que a cultura é redefinida por um processo de comercialização, transformada num campo de investimentos, especulação e consumo como qualquer outro, criando uma indústria que se esforça por compensar o extremo empobrecimento da vida social, cultural e emocional, arrebatando as pessoas para uma celebração permanente das mercadorias, saudadas como imagens, como novidades, como objetos eróticos, como espetáculo” (Sevcenko). A mercadoria se torna o centro absoluto da vida social e as trocas entre os sujeitos passam a ser indiretas, tendo por intermediária a imagem.

Ao fazer o diagnóstico da deturpação da sociabilidade pela mercadoria eles propõem uma “revolução integral na vida cotidiana” que haveria de reivindicar o viver do tempo histórico, buscando a desmontagem do capitalismo enquanto civilização. Isso aconteceria pela implementação dos conselhos operários, pela autogestão e pela inovação do surrealismo. O surrealismo é revivido sob o signo não conformista absoluto que têm como linguagem os elementos semânticos da revolução, se erguendo contra todos inclusive os revolucionários. Em todos os lugares, sustentavam incondicionalmente todas as formas de liberdade dos costumes, a chamada libertinagem.

Esse coletivo coloca-se não só como o negativo da sociabilidade burguesa, mas também como o negativo daqueles que se antepunham “formalmente” a ela. Ele busca afrontar as vicissitudes dos projetos revolucionários de seu tempo, para anunciar-lhes a derrota antecipada. Para eles as palavras “movimento político” escondem o aparelhamento promovido pelos lideres de grupos e partidos, que se servem da a passividade organizada de seus militantes e da força opressiva de seus poderes. A I.S. repudia o poder hierárquico, sob qualquer forma que se apresente. Logo não é um movimento político clássico.

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