Sunday, March 27, 2011

NOVAS FORMAS DE LUTA

É possível que o futuro lembre-se de 8 de dezembro de 2010 como o dia em nasceu o hacktivismo, ou hacker-ativismo, global. Pela manhã, centenas de jovens, agindo a partir de vários pontos do planeta e articulados numa rede de nome Anonymous, iniciaram um cerco ao site global da operadora de cartões de crédito Mastercard. Conseguiram mantê-lo fora do ar, ou torná-lo absurdamente lento, ao longo de várias horas — a ponto de obrigar a empresa a reconhecer o colapso. Nas horas e dias seguintes, foram atacados outras empresas ou instituições que se envolveram na perseguição arbitrária ao Wikileaks, ou defendem formas de controle autoritário da internet. Entre eles, Visa, PayPal e o banco suíço Post Finance (que bloquearam, sem ordem judicial, as doações e contas bancárias do site cujas revelações perturbam os poderes); a procuradoria da Suécia (que lançou contra o jornalistas Julian Assange uma acusação inverossívil de estupro); o senador norte-americano Joe Lieberman (autor de um projeto de lei que autoriza o presidente dos EUA a fechar sites, alegando razões de “emergência”).
Não foi, propriamente, a primeira ação. Há anos, há sinais de hacking coletivo com fins vagamente políticos. Mas o feito da semana passada distingue-se tanto pela envergadura dos alvos atingidos quanto por três novidades essenciais. Lutou-se em favor de uma causa capaz de despertar apoiadores em muitos países: a liberdade de expressão, materializada em especial numa internet livre de censura. Difundiram-se instrumentos de ação que podem ser empregados por qualquer pessoa com acesso à internet, e aperfeiçoados no futuro. Produziram-se fatos cuja relevância e repercussão, já enormes no primeiro ensaio, podem crescer indefinidamente, num mundo em que poder e dinheiro circulam, cada vez mais, na forma de bits.
Surgiu, em suma, o embrião de uma nova forma de ação política. Examinar a história, ideologia de fundo é métodos do Anonymous tornou-se importantíssimo. Conhecer sua evolução – de uma comunidade juvenil para troca de imagens até uma teia capaz de amedrontar instituiçoões financeiras internacionais – é, além disso, fascinante.
Decretadas em dezembro, a prisão de Julian Assange e as medidas autoritárias contra o site de que ele é referência desenharam, para um Anonymous remobilizado, um conjunto de alvos óbvios. A Operation Payback voltou-se com velocidade de enxame contra as corporações financeiras e instituições envolvidas na perseguição ao Wikileaks. E cresceu muito, nesta ação. Gregg Housh, um membro veterano, contou ao jornalista John Markoff, do New York Times, que nunca vira tanta gente, nos fóruns eletrônicos do Anonymous. Segundo suas contas, havia 1500 pessoas, em todo o mundo, prontas para agir. O motivo era simples. “Para todos nós, ele [Assange] é um prisioneiro político”, afirmou Housh. Alguém a quem não se podia negar solidariedade imediata. “Lutamos pelas mesmas razões. Queremos transparência e enfrentamos a censura”, disse a Markoff outro participante do contra-ataque.
“Sabemos que nossa ação é ilegal, mas sentimos que a causa é justa e jugamos que o possível resultado vale o risco. Se deixarmos o Wikileaks cair sem luta, os governos pensarão que podem derrubar qualquer site que discordar”, explicou, numa entrevista ao TheGuardian londrino, um integrante do Anonymous que se identificou com seu codinome na rede, Coldblood (Sanguefrio).
Em contrapartida, as relações que o grupo cultiva entre si mesmo são a antítese do comando centralizado e hierarquia característicos da antiga tradição marxista. Não há chefes, ou estrutura. A
rigor, o Anonymous não pode ser sequer chamado de grupo, porque não é composto de membros. Sua
única materialidade são, paradoxalmente… as ideias.
Na semana passada, um repórter da revista Economist entrou, identificado, num destes messageboards. Impressionou-se com a extensão da rede: nos minutos em que permaneceu, teve a companhia de gente da Noruega, Nepal, Leste da Rússia, Nova Zelândia
“Mastercard e Visa, que intermidiam relações humanas essenciais, feriram a ética e a lei. Sem respaldo de nenhum processo legal, bloqueram o direito de milhares de cidadãos a contribuir com o Wikileaks.

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