Wednesday, October 13, 2010

DO NOVO DEUS


DO NOVO DEUS

Hoje tenho de agradecer a inspiração à D. Arminda da “Motina”. A confeitaria com rádio e sem televisão faz toda a diferença. Apesar de só ter lido o jornal, os últimos livros que li estão a fazer efeito. Sei lá, são como os comprimidos. Miller é uma pedra. Nietzsche é uma pedra. Kierkegaard é uma pedra. Hoje vejo os horizontes claramente alargados. Há dias verdadeiramente triunfais. E hoje ainda não falei com ninguém. É impressionante como um homem se sente atado e um dia se levanta às três da tarde e, sem saber porquê, a mente começa a libertar-se. Será, em parte, da doença mas acredito que só os verdadeiros criadores se sentem assim. As ideias dançam. Há uma vontade louca de me agarrar ao papel. Não tenho explicação. Sinto-me capaz de discorrer sobre qualquer tema. Tenho opiniões absolutamente lúcidas e definitivas sobre a situação política nacional e internacional. Desejo ardentemente que o orçamento não passe, que o governo caia, que o país fique a arder. Não as casas, não as pessoas mas as instituições, as bolsas, os mercados. Especialmente as bolsas e os mercados. São estes o Deus a quem (quase) todos obedecem. Não, não me peçam análises imparciais e isentas. Não me peçam para ser o filósofo de Platão. Não me compete dirigir ou governar coisa nenhuma. Neste momento sou um incendiário. É também assim, às marteladas, que se destrói o velho homem para se construir o novo. Estou lúcido. Estou absolutamente lúcido. Não me peçam moderação nem sentido de Estado. Ainda assim tenho de agradecer à D. Arminda. Não peço bolos mas estou possesso na confeitaria. Derramo tinta no papel. A tinta vive. Sinto poderes mediúnicos. Tenho iluminações. Não me peçam para adorar os mercados. Não me peçam para ser apenas mais um. Antes ser louco, antes tornar-me louco, como disse Nietzsche. Não, não conteis comigo, ó banqueiros. Não embarco na vossa viagem, como diz Morrison, ó mercadores, merceeeiros, ó políticos trapaceiros que ao novo Deus dais o cu. Não, não sou do deus a que prestais vassalagem, aos mercados. O artista falha, o artista fraqueja mas o artista não tem que obedecer a deus nenhum.

No comments: