Wednesday, May 02, 2012

O homem volta a pegar na caneta e escreve. Agora não tem computador. Está em Braga, na "Pastelaria São João", mesmo ao lado da casa da Gotucha. Tem Antero de Quental à sua frente. Escreve. Pensa. Espera pelo segundo café. Estreou um novo caderno, mais pequeno. A poesia é uma forma de resistência. Uma forma de liberdade livre, de vida plena. O homem escreve poesia na forma de prosa. Logo à noite talvez vá ao Pinguim. As pessoas vão entrando na confeitaria. O homem faz um esforço para escrever. O mesmo que fazem outros escritores, mais famosos. Ainda assim escreve. Vai buscar a matéria da escrita às profundezas de si mesmo. Deveria talvez inventar outros personagens, como fazia na infância. O Francisco José, o Celorico D' Almeida. Mas continua a contar a história de si mesmo. Olha a Avenida da Liberdade. Os carros que passam. Os prédios. Os apartamentos. Se os ficheiros desaparecem do computador sempre tem os cadernos. Embora corra também o risco de os perder. O Isaque Ferreira já se ofereceu para os guardar. O homem á mesa. A chávena de café. A confeitaria. Tudo parte daqui. É este o mundo. O homem, de vez em quando, dá umas entrevistas. Fica registado. Diz ao mundo o que pensa. No entanto, ainda não conseguiu dizer tudo o que pretende dizer. Ainda não denunciou a máquina na sua plenitude. No fundo, é este que está aqui à mesa de escrever. Não tem um trabalho fixo nem o poderia ter agora. Ao escrever sobre si mesmo, escreve sobre o mundo. De qualquer modo, o mundo, o país, está uma desgraça. Enquanto que o homem continua a escrever, a criar. O governo, a Merkel e a troika destroem o país e o homem continua a escrever. Tem papel, caneta, mãos e café. É o suficiente para prosseguir, aparte os amores e as amizades. Oxalá o caderno não se perca.

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