Monday, March 23, 2009
MAIO DE 68 E A INTERNACIONAL SITUACIONISTA
Maio de 68 e a Internacional Situacionista
Elisa Klüger, dezembro de 2006
O abalo do cotidiano pelo meio estudantil
“O que queremos de fato e que as idéias voltem a ser perigosas”
Introdução
“A imaginação no poder”.
“A felicidade é o poder estudantil”.
A proposta desse trabalho é coletar e articular informações que nos permitam entender a singularidade e a criatividade do movimento de maio de 68, buscando analisar o papel da juventude nesse processo, entendendo-na como o fator determinante da trajetória e das idéias da revolução.
Quais as forças sociais e os processos históricos que deram origem ao maio de 68? Qual foi o papel dos jovens e dos situacionistas? Em que medida as proposições do movimento estavam associadas à forma de inserção deles na sociedade? Que novos questionamentos e proposições foram feitos no maio de 68? Quais foram seus desdobramentos? Houve uma originalidade na forma de fazer política e de pensar o cotidiano proposta por essa revolução? O que a tornou mundialmente influente?
Esse tema e essas questões foram escolhidos por proporcionarem um esclarecimento sobre a história e as perspectivas transformadoras de movimento estudantil permitindo a reflexão, a crítica e o aperfeiçoamento decorrente. Especialmente interessantes para alguém que inicia sua inserção nesse meio.
Levantes revolucionários
“A liberdade do outro amplia a minha ao infinito” (Bakunin).
“Não reclamaremos nada. Não pediremos nada. Tomaremos. Ocuparemos”.
“Uma revolução não ocorre apenas sob o efeito de um conflito interno entre opressores e oprimidos, mas advém do momento em que se apaga a transcendência do poder, no momento em que se anula sue eficiência simbólica” (Matos). Em maio de 1968 a transcendência do poder foi questionada, e se não foi essa uma revolução institucional definitiva, foi certamente uma revolução da forma de fazer política e do cotidiano que é também cerceado pelo poder.
Maio de 68 foi o maior levante revolucionário da Europa ocidental desde a Comuna de Paris. Estudantes batalharam intensamente com a polícia, milhões de trabalhadores estiveram em greve. “A bandeira vermelha e a bandeira preta tremularam sobre fábricas ocupadas, universidades, canteiros de obras, estaleiros, escolas primárias e secundárias, entradas de minas, estações ferroviárias, lojas de departamento, navios transatlânticos ancorados, teatros, hotéis. Praticamente todos os setores da sociedade francesa se envolveram em certa medida. Centenas de milhares de pessoas de todas as idades discutiram todos os aspectos da vida em reuniões lotadas e ininterruptas em todas as salas de aula ou auditórios disponíveis” (Solidarity). Fez-se história, de maneira não passiva, o que e a essência de uma revolução.
Mesmo assim não se concretizou a revolução. (no sentido de instalar uma nova estrutura institucional que permita a transformação da economia e da sociedade) e questiona-se se isso poderia ter sido feito. Os estudantes, por mais numerosos, mobilizáveis e desproporcionalmente eficazes que fossem não podiam fazê-la sozinhos. Porque sendo um grupo relativamente pequeno, transitório e sem o poderio econômico da riqueza, que permite a dominação (burguesia) ou o poder de abalar a acumulação, por serem parte constitutiva dela (operários) não tinham os meios materiais e políticos necessários para autonomamente implementar um novo sistema. A efetividade política deles estava em sua capacidade de agir como sinais e detonadores para grupos maiores que se inflamavam com menos facilidade, provocando paralisações temporárias da economia de países inteiros, que mostraram que a revolução socialista em um país fortemente industrializado era uma questão real.
Contexto mundial
“Nosso modernismo não passa de uma modernização da polícia”.
“Por favor, deixe o PC (Partido Comunista) tão limpo ao sair quanto voceê gostaria de encontrar ao entrar”.
Primeiramente é importante situar o ano de 68, no período da guerra fria, conflito político-ideológico entre os defensores do capitalismo e os defensores do socialismo, que compreende o período entre o final da Segunda Guerra Mundial e a extinção da União Soviética. Particularmente no período de distensão que se segue a crise dos mísseis, no qual começam aos poucos negociações entre os dois blocos, e no período da guerra do Vietnã, que é um objeto de repúdio global do meio estudantil, o qual influencia todas as revoltas do período.
Outra especificidade do período abordado é a modificação pela qual as esquerdas passam apos o XX congresso de PCUS em 1956, conhecido como desestalinização. Três anos após a morte de Stalin, Kruschev divulga seu “relatório secreto” apontando os crimes de Stalin.
Pode-se dizer também que “esse foi o início de uma nova era do capitalismo, que manifestava uma correlação demográfica nova, em que o peso da juventude era maior, acompanhada de transformações na maneira de produzir, que tornavam obsoletas as maneiras anteriores da divisão social do trabalho. O peso específico da classe operária começava a decrescer e o controle soviético sobre a esquerda no mundo já não era o mesmo”. (Schwartz).
Era notável, que o mundo aumentava o seu caráter tecnoburocrático. Havia uma oposição entre a modernização técnica e econômica e as formas de organização social cultural arcaica cuja função era manter as tradições e princípios e não permitir mudanças.
Há uma ruptura entre a produção de conhecimento e a utilidade social do indivíduo e do conhecimento adquirido, no contexto da vertiginosa transformação das tecnologias e obsolescência do modo de produção. Isso afeta a universidade e a lógica do desenvolvimento de conhecimento. O saber produzido em forma de ciência e técnica é determinado pelas necessidades da produção de mercadorias, e o produzido em forma de ciência social estava a serviço do poder instituído.
Movimento internacional
“Viva os estudantes de Varsóvia”. (Paris)
“Somos todos judeus alemães”.
A Extraordinária explosão de maio de 68 em Paris foi o epicentro de um levante estudantil mundial, caracterizado pela simultaneidade, mas não pela coordenação.
“A revolta estudantil de fins da década de 60 foi a última arremetida da velha revolução mundial. Foi revolucionária tanto no antigo sentido utópico de buscar uma inversão permanente nos valores, uma sociedade nova e perfeita, quanto no sentido operacional de procurar realizá-la pela ação nas ruas e barricadas, pela bomba e pela emboscada na montanha. Foi global não só porque a ideologia da tradição revolucionária de 1789 a 1917, era universal e internacionalista, mas porque pela primeira vez, o mundo, ou pelo menos o mundo em que viviam os ideólogos dos estudantes, era verdadeiramente global. (livros, telecomunicações, avião, turistas). Os estudantes de final da década de 1960 não tinham dificuldades para reconhecer o que acontecia na Sorbonne, em Berkeley, em Praga, como parte do mesmo acontecimento, na mesma aldeia global”. (Hobsbawn)
A juventude que participou desse movimento talvez tenha aprendido a não mais se identificar com as fictícias fronteiras, a não mais idolatrar nenhuma civilização superior. Esses jovens tiveram no Vietnã seu tema de unificação e passaram a fazer reivindicações comuns nas diversas partes do globo, pois as opressões que viviam eram muitas vezes semelhantes.
Há uma interconexão entre as atuações dos jovens que ocorreram no período em diversos paises. O que as unia era uma semelhança na contestação da sociedade estabelecida, que esteve acima das diferenças de contexto sócio-político-econômico. Para analisar essa relação faz-se pertinente a descrição de algumas ocorrências fora da França.
Nos EUA, era central a recusa da guerra do Vietnã, e de todas as conseqüências negativas por ela trazidas. O movimento foi caracterizado pela deserção, desobediência civil e recusa da sociedade de consumo, simbolizado pela contracultura e pelo movimento hippie. A arte veio a tomar o lugar da política, provocando inversões das significações habituais, flower power.
Berlim Ocidental, a “Vitrine fora de moda” do mundo “livre”, o instrumento de propaganda do sistema capitalista, passou por uma renovação cultural inspirada em pensadores antiautoritários.
Na Polônia, especificamente em Varsóvia, como reação a repressão cultural (cujo estopim foi a proibição de uma peça de teatro), houve uma ocupação da universidade pelos estudantes, acompanhada de greve estudantil que a policia reprimiu com a ocupação das dependências da universidade.
Na Tchecoslováquia o eixo do movimento foram os protestos contra o stalinismo e a burocracia, marcado fortemente pela ideologia “conselhista”. Era uma busca pela liberdade política, contra o dogmatismo da interpretação oficial do marxismo.
O Japão por sua proximidade com China e Vietnã se envolvia na geopolítica estabelecida para a região, servindo de base aérea para as forcas americanas, o que interferia no cotidiano do país. Os estudantes fazem denúncias dos acordos comerciais e militares nipoamericanos, pois rejeitam-nos.
O foco de ação espanhol foi a luta contra a ditadura franquista. Ocorreu o levantamento de barricadas e a criação de assembléias sindicais ilegais. A polícia reage ocupando o interior da universidade.
Na Itália estão pautados: a luta contra o autoritarismo na universidade e contra a mercantilização da cultura e do homem.
No Brasil, e na América Latina como um todo, a resistência contra as ditaduras e contra a influencia norte-americana dá origem aos movimentos de contestação cultural, como o tropicalista, e as ações que radicalizam os métodos, como a guerrilha.
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