Friday, October 12, 2012

A BARBÁRIE

Edição 81, 12 Outubro 2012 A BARBÁRIE Em 1845, em “A Essência do Dinheiro”, Moses Hess afirma que o capitalismo traduz a dominação exercida pelo deus-dinheiro sobre os homens, constituindo um sistema que coloca à venda a liberdade humana. O dinheiro é a essência e traz um mundo pior do que o da escravatura antiga porque “não é natural nem humano que alguém se venda a si próprio voluntariamente”. A tarefa do comunismo é, assim, abolir o dinheiro. Para Gustav Landauer essa tarefa não é aperfeiçoar o sistema industrial-capitalista mas ajudar os homens a redescobrirem a cultura, o espírito, a liberdade, a comunidade. Para outros, o capitalismo é traficar a alma, o espírito, o pensamento. Para Marx, exige-se “a revolta contra um mundo que transformou cada coisa numa mercadoria e degradou o homem, reduzindo-o ao estatuto de objecto”. Sim, temos o direito de exigir o homem integral. O poder do dinheiro pode destruir todas as qualidades humanas e naturais, reduzindo-as ao quantitativo. A troca de afectos é substituída pela troca do dinheiro por uma mercadoria. Não existe nada de mais abjecto do que o capitalismo e os seus mercadores e economistas. Reduzem tudo ao cálculo, ao deve e haver, ao orçamento. Cortam na vida das pessoas como se tratassem com objectos. A sensibilidade é substituída pela posse. Como dizem Michael Lowy e Robert Sayre em “Revolta e Melancolia”, “o ser, a livre expressão da riqueza da vida por actividades sociais e culturais, é cada vez mais sacrificado ao ter, à acumulação do dinheiro, das mercadorias e do capital”. O homem está fortemente condicionado na sua capacidade criativa pelas drogas que nos atiram todos os dias via media e por um mercado implacável. Segundo Lukács, “tudo deixou de ser avaliado por si próprio, pelo seu valor intrínseco- artístico ou ético- e apenas tem valor enquanto mercadoria vendível ou comprável no mercado”. É a barbárie, a selvajaria. Nem sabemos como ainda pode haver algum amor, algum diálogo, alguma filosofia. Eles estão a destruir o que de mais genuíno há no homem, esses merceeiros, esses moedeiros. Isto não é apenas a crise económica, isto não é apenas o irem-nos aos bolsos, isto é irem-nos à alma, destruírem os verdadeiros progressos da humanidade. Isto é destruir a vida. Não podemos mais aceitá-lo. Somos homens e mulheres. Não somos objectos, não somos notas e moedas. --- ESTAR AQUI Vir ao mundo, receber a graça de vir ao mundo. Depois brincar, ser livre. Ir à escola, aprender mas também ser moldado pela máquina, pelo mercado. Começar a questionar as coisas, guardá-las para si ou debatê-las com os melhores amigos. Fazer o liceu, ir para a Faculdade. Sair à noite, celebrar a noite, experimentar a liberdade. Mas depois voltar à máquina, ao mercado, à competição. Ler uns livros que contrariam isso. Depois vem novamente o ganhar a vida, o safar-se, o lutar pela existência, o passar por cima dos outros. Questionar tudo isso novamente, estar aqui no café com os livros, experimentar a liberdade. Saber que há uma via que está para lá da escravidão, do ser mais um, saber que essa via pode ser dolorosa mas saber que ela existe. Estar aqui, saber que não se está aqui por acaso, que temos um propósito, uma missão. Saber que isto está muito para lá do pão nosso de cada dia. Saber que isto não é o trabalho absurdo. Procurar o amor e o conhecimento. Ser o homem íntegro, integral. Não se deixar levar pela grande depressão. Estudar, ler os grandes, filosofar. Estar aqui, estar vivo, sem culpas nem pecados. Estar aqui soberano, sem patrões. --- A LUTA COMUM Grécia, Portugal, Espanha. A mesma luta. Contra os governos ultra-liberais, contra a austeridade, contra a troika. Mas também o combate contra a democracia burguesa, contra o sistema político, contra o capitalismo dos mercados. Milhões nas ruas a dizer sim à vida, contra os banqueiros e os especuladores da morte. Milhões a dizer basta. Milhões a dizer que isto não serve, que isto não presta. Que se esgotaram todas as negociações, todas as concertações sociais. Que exigimos o mundo e exigimo-lo agora, como cantava Jim Morrison. Que não é mais possível suportar o roubo, a vigarice, a mentira. Que somos cidadãos, homens livres, e não escravos ou macacos. Que temos de fazê-los cair de uma vez por todas. www.jornalfraternizar.pt.vu

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