Monday, November 22, 2010

A BARBÁRIE E A TERNURA

A BARBÁRIE E A TERNURA

Na Grécia rebentam bombas e eu, paradoxalmente, volto a acreditar na ternura. Estamos a um passo da barbárie e eu volto a acreditar na ternura.
Sim, basta um pequeno passo. Basta que o respeito, a civilidade que ainda existe nas relações entre as pessoas deixe de existir para que a barbárie triunfe. O capitalismo do mercado e dos mercados tudo tem feito para destruir as relações fraternas e autênticas entre os homens. O meu amigo Carlos Pinto era e é um exemplo de resistência a esse estado de coisas. Porque cultivava verdadeiramente os afectos. E o afecto sincero, desprendido, vai rareando. O que sobra é algum respeito, as boas maneiras, alguma educação, no fundo, a civilização. Isto se ainda consegues ir aos sítios pagar o café e o jantar. Se não ninguém te respeita. O que é facto é que vivemos sob a ditadura de um sistema terrível, inumano, que, por si só, destrói o espírito e o coração. A lei dos mercados é absolutamente bárbara, selvática, sob a capa de uma pretensa racionalidade económica. A lei dos mercados e dos especuladores/agiotas/banqueiros determina tudo, desde as decisões dos governos e da União Europeia até ao quotidiano do cidadão comum. Perante um inimigo desta dimensão é natural que comecem a surgir actos de revolta desesperados, como os explosivos da Grécia, as montras partidas ou os carros incendiados em França. Essas formas de resistência, que nada têm a ver com o Alá da Al-Qaeda, são perfeitamente legítimas sob esta “ordem” que nos sufoca e que nos tira a vida. Não há pacto possível com o capitalismo dos mercados. É claro que alguns, como o padre Mário de Oliveira, nos falam de uma via pacífica. Há algo que nos empurra para essa via dos afectos, das mesas partilhadas, de Jesus, da filosofia enquanto fim da violência. Mas também é em nome dos afectos, da ternura entre os homens e as mulheres que resistem à contaminação do mercado e dos mercados, que dizemos que não aceitamos esse mundo, que temos de combatê-lo e destruí-lo todos os dias porque ele está a destruir as relações entre os homens e a própria vida.

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